Caso perca o cargo de deputada, a ida da pastora para a cadeia é iminente
Foto: MARCELO THEOBALD / Agência O Globo.
Primeiro, a decadência das suas igrejas. Em seguida, a perda do contrato com a gravadora gospel MK Music. Pastora, cantora e deputada federal, Flordelis dos Santos de Souza enfrenta agora o risco de perder o mandato de parlamentar. Mais do que a única função ainda capaz de lhe render lucros, o mandato é também o que ainda a mantém em liberdade. Ao se tornar ré por ser mandante da morte do marido, Flordelis só não teve a prisão pedida à Justiça por ter imunidade parlamentar, uma prerrogativa prevista na Constituição Federal. Caso perca o cargo de deputada, a ida da pastora para a cadeia é iminente.
O destino de Flordelis deve ser decidido nos próximos meses.
Na última semana, teve início o processo disciplinar contra ela na Corregedoria
da Câmara dos Deputados. Depois de duas tentativas frustradas, a parlamentar
foi notificada na última quarta-feira para apresentar sua defesa em um prazo de
cinco dias úteis, que pode ser prorrogado por igual período.
O processo contra Flordelis ainda é longo. Após a
apresentação da defesa da deputada, a corregedoria vai encaminhar um relatório
com seu parecer sobre o caso à Mesa Diretora da Casa. O relatório terá que ser
aprovado, e só então vira uma representação e será enviada à Comissão de Ética
e Decoro Parlamentar. Nela, terá que passar por nova aprovação para, apenas em
seguida, ser encaminhado ao plenário. Só então haverá a votação final que
decidirá o destino de Flordelis.
A deputada poderá apresentar defesa em todas as etapas — além
da corregedoria, Mesa da Diretora, Comissão de Ética e Plenário da casa.
Os trâmites podem demorar ainda mais porque as sessões das
comissões da Câmara dos Deputados estão suspensas em razão da pandemia do novo
coronavírus. Corregedor da casa, o deputado Paulo Bengtson (PTB-PA) apresentou,
no fim do mês passado, um projeto de resolução que autoriza o Conselho de Ética
a realizar reuniões virtuais, o que é proibido atualmente. A previsão é de que
ele seja votado apenas na próxima semana. Em entrevista ao EXTRA, Bengtson
explicou que após apresentação da defesa, a corregedoria tem um prazo de 45
dias para emitir seu parecer, mas isso deve acontecer em, no máximo, 15 dias.
— Fizemos uma força-tarefa para analisar as 8 mil páginas de
inquérito, material que nos foi enviado pelo auxiliar de acusação (advogado
Ângelo Máximo, que atua no processo da 3ª Vara Criminal de Niterói). Com isso,
estamos conseguindo adiantar nosso trabalho para dar uma resposta rápida para a
sociedade. A Casa está atenta, pois é um caso de grande comoção nacional —
detalha.
O deputado evita estimar o tempo que deve levar para o
processo chegar ao fim. O corregedor explica também que, além da perda de
mandato, a Comissão de Ética pode decidir pela suspensão do mandato da pastora
por seis meses ou até pelo arquivamento do caso, hipótese que ele considera
pouco provável.
Acusada de quebra de decoro
O processo que pode culminar com a perda do mandato de
Flordelis teve início com uma representação do deputado federal Leo Motta
(PSL-MG) à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. A denúncia encaminhada pelo
parlamentar foi de que a pastora teve “atos incompatíveis com o decoro
parlamentar”.
A falta de decoro pode se dar pelo abuso das prerrogativas de
parlamentar, recebimento de vantagens indevidas ou praticar irregularidades
graves no desempenho do mandato que afetem a dignidade da representação
popular.
O deputado Paulo Bengtson esclarece que o processo
disciplinar não se propõe a julgar Flordelis pelos crimes respondidos por ela:
Todo o processo criminal serve de base para o nosso
relatório. Mas nossa análise será se houve quebra de decoro e não a parte
criminal. Iss o é importante ficar bem claro — explica o parlamentar.
Além das provas relativas ao assassinato de Anderson, da qual
Flordelis é acusada de ser mandante, estão sob análise os indícios de
rachadinha — quando parte do salário do assessor fica com o político — e
nepotismo — prática pela qual um agente público usa de sua função para
contratar ou nomear parentes — no gabinete da pastora.
As evidências das duas práticas foram encaminhadas pelo
Ministério Público estadual do Rio para a Procuradoria Geral da República.
Desfiliada de partido
Dias após ter sido denunciada, Flordelis teve sua primeira
derrota na política. O presidente do PSD, Gilberto Kassab, anunciou que a
deputada seria desfiliada do partido. Logo depois, ela foi afastada da Bancada
Evangélica na Câmara dos Deputados, da qual era vice-presidente.
Com a perda do mandato, a ida de Flordelis para a cadeia
ainda dependerá de um pedido de prisão feito pelo Ministério Público estadual
do Rio à 3ª Vara Criminal de Niterói. A solicitação não chegou a ser feita na
ocasião em que a Justiça decidiu transformar a deputada em ré, uma vez que ela
não poderia ser presa pela imunidade parlamentar.
A Constituição Federal prevê que que deputados e senadores só
podem ser presos em flagrante e por crimes para os quais não caba fiança.
Diante da impossibilidade de prisão, o MP pediu que Flordelis fique submetida a
algumas medidas cautelares, como a proibição de ter contato com outros réus no
mesmo processo.
O advogado Ângelo Máximo, que representa o pai de Anderson do
Carmo, considera a prisão de Flordelis a mais importante do processo. Sete
filhos e uma neta da deputada estão presos por envolvimento na trama.
É a prisão com a maior necessidade, diante de todas que
ocorreram. Solta, ela é um perigo à instrução criminal, ordem pública e todos
os envolvidos na busca por Justiça.
Ângelo Máximo, advogado e assistente de acusação, diz que
Flordelis é “líder da organização criminosa”:
A prisão da Flordelis é de extrema importância diante de
tudo que ela fez, praticando todos os mandos e desmandos diante de tudo que foi
apurado pela polícia e demonstrado nos autos. Ela é a líder da organização
criminosa, como bem classificou a autoridade policial. A prisão dela é
extremamente necessária a ponto de se mostrar que, no Brasil, esse país
desacreditado que vivemos, nós não podemos perder nossa fé e nossa esperança. A
fé é de que a Câmara dos Deputados irá afastá-la do cargo de parlamentar. E a
esperança é de ver a Justiça reestabelecida, seguindo o seu viés sem delongas,
sem uso de imunidade parlamentar. Que a ação penal possa correr à vontade nos
seus trâmites normais. Ou seja, a esperança é de ver a Justiça decretar a
prisão preventiva dessa denunciada que ainda se encontra em liberdade,
colocando em risco toda a instrução criminal. Ela tentou diversas vezes
atrapalhar as investigações e algumas vezes conseguiu. Dependemos da Casa
Legislativa afastá-la do cargo. Não pode a casa dos representantes no povo ter,
no meio de seus integrantes, uma fruta estragada. Uma pessoa dessa não pode
estar na Câmara dos Deputados.
Detalhes do assassinato do pastor Anderson
O pastor Anderson do Carmo, marido de Flordelis, foi morto a
tiros na garagem da casa da família, em Pendotiba, Niterói, Região
Metropolitana do Rio, na madrugada de 16 de junho de 2019.
Flordelis foi denunciada pelo Ministério Público estadual do
Rio por ter sido a mandante do crime. Além disso, a deputada foi acusada de
tentativa de homicídio, pois, segundo o MP, vinha tentando envenenar Anderson
desde maio de 2018.
A pastora responde ainda por organização criminosa, uso de
documento falso e falsidade ideológica. Esses crimes têm relação com um plano
para atrapalhar as investigações do caso, que, segundo o MP, foi tramado por
Flordelis.
Fonte: Extra
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