Espécie de fortaleza petista no Estado que foi o berço do bolsonarismo, a cidade tem cerca de 160 mil habitantes
O ano eleitoral de 2016 foi um marco para o antipetismo no
País. O impeachment da presidente Dilma Rousseff, o avanço da Operação Lava
Jato e as denúncias contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva levaram o
PT a sofrer uma dura derrota nas eleições municipais. A legenda perdeu centenas
de prefeituras que controlava pelo País. No Estado do Rio, onde os petistas
ocupavam dez das 92 administrações municipais, só sobrou uma sob seu controle:
a praieira Maricá.
Espécie de fortaleza petista no Estado que foi o berço do
bolsonarismo, a cidade tem cerca de 160 mil habitantes. Seu atual prefeito,
Fabiano Horta, é apontado como favorito para se reeleger com tranquilidade em
novembro. A liderança pode ser explicada por programas de transferência de
renda e por medidas como a tarifa zero nos ônibus municipais, implementados nas
gestões do partido. Tudo isso é financiado por receitas milionárias de
royalties do petróleo - foram R$ 73,6 milhões em setembro deste ano, por
exemplo.
Há apenas três candidatos à prefeitura contra o PT, que
governa o município há 12 anos - e nenhum tem grande expressão eleitoral.
Enquanto isso, aquele que até 2016 era o principal adversário do grupo político
do prefeito aliou-se a ele e migrou para Itaboraí, município vizinho. Concorre
à prefeitura de lá com um vice do PT e promessas de campanha inspiradas nos projetos
adotados em Maricá nos últimos anos.
Aos eleitores, Marcelo Delaroli (PL), curiosamente, se
apresenta com o nome de outra cidade. É "Marcelo Delaroli de Maricá".
A escolha ocorreu depois de pesquisas mostrarem que os habitantes de Itaboraí
viam positivamente as mudanças em curso no município próximo. Enquanto isso, o
pragmático Delaroli se equilibrou entre o apoio à família Bolsonaro, com a qual
tem boa interlocução, e o governador afastado Wilson Witzel (PSC), em cujo
governo trabalhou como subsecretário de Saneamento Ambiental.
O grupo político hegemônico em Maricá "exportou"
ainda outro candidato, desta vez para a populosa São Gonçalo, cidade vizinha
com mais de 1 milhão de habitantes e segundo maior colégio eleitoral do Estado.
Está ali, com o petista Dimas Gadelha, a maior esperança do partido de
conquistar um Executivo, além de Maricá, em terras fluminenses.
Pelas ruas da cidade, tomadas por bandeiras e adesivos de
carro neste período eleitoral, é raro encontrar material de campanha dos
opositores do PT. O que se vê, na maior parte das vezes, são vereadores de
partidos variados que colam suas imagens à do prefeito petista.
Fabiano Horta é um homem tímido e que pouco tem aparecido
publicamente durante a campanha. Tem perfil oposto ao de seu antecessor,
Washington Quaquá, hoje vice-presidente nacional do PT e há anos comandante do
partido no Rio. Excêntrico e com histórico de polêmicas, Quaquá é a figura
central para entender como a cidade chegou à situação política e administrativa
em que está hoje.
Foi na gestão dele, entre 2009 e 2016, que Maricá implementou
o programa de renda básica. A Renda Básica de Cidadania atende hoje cerca de 42
mil maricaenses e trabalha com uma moeda social que só vale na cidade. Cada
cidadão inscrito no programa recebe por mês 130 mumbucas, equivalentes a R$
130. São mais de 6 mil lojas credenciadas para receber o pagamento. Só o
comércio de Maricá tem as maquininhas que "transformam" mumbucas em
reais.
Ainda aproveitando o dinheiro dos royalties, Quaquá
implementou um serviço de ônibus gratuito. Os "Vermelhinhos", como
são conhecidos, circulam pelas ruas do município exibindo o letreiro
"Tarifa zero". Algumas linhas ainda operam por meio de empresas privadas,
mas, com o fim do contrato em 2021, a tendência é que toda a rede seja de
graça. Outra iniciativa popular do ex-prefeito foi o Hospital Municipal Dr.
Ernesto Che Guevara, em um terreno de 130 mil metros quadrados na beira da
estrada. A unidade tem equipamento de ponta e foi inaugurada durante a
pandemia, atendendo exclusivamente vítimas da covid-19.
A homenagem ao médico argentino, um dos líderes da Revolução
Cubana, ajuda a entender algumas das polêmicas envolvendo a gestão petista em
Maricá. Outro ponto é o fato de toda a identidade visual da prefeitura,
incluindo os ônibus gratuitos, terem o vermelho como cor predominante, o que
associa a gestão ao PT. Há ainda uma rua batizada com o nome do líder
guerrilheiro Carlos Marighella.
Nas redes sociais, militantes de esquerda chamam Maricá de
"Quaqualingrado". Trata-se de uma referência a Stalingrado, cidade em
que o Exército Vermelho da União Soviética, então comandada por Josef Stalin,
derrotou os nazistas, marcando a virada dos Aliados na Segunda Guerra Mundial.
"O Bolsonaro não está errado quando faz a luta pela direita. Nós temos que
fazer pela esquerda. Há uma disputa de ideário na sociedade", afirma
Quaquá.
Hoje dedicado mais a questões nacionais do PT do que a
Maricá, o dirigente partidário foi eleito deputado federal em 2018, mas não
tomou posse, já que é considerado inelegível pela Justiça Eleitoral. Acusado de
abuso de poder político e econômico por aumentar em até 100% o salário de
servidores em períodos que a legislação não o autorizaria, ele nega as
irregularidades. Seu filho de 22 anos, Diego Zeidan, concorre a vice na
reeleição de Horta. Será o sucessor natural para 2024.
Para o bolsonarista Ciro Fontoura (Republicanos), um dos que
tentam enfrentar o PT neste ano na disputa pela prefeitura, há uma
"máfia" no comando do município, que prioriza a ampliação da
hegemonia política em vez de pensar em melhorar o saneamento básico, por
exemplo. "A ideia de Maricá é fazer dar certo um socialismo que no mundo
todo não deu certo", disse. Em seu programa de governo, Fontoura incluiu
como meta retirar o nome de Che Guevara do novo hospital municipal.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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