Um dos exemplos mais recentes desse movimento foi o anúncio de venda pelo Pão de Açúcar de 71 lojas do Extra Híper ao Assaí, num negócio de R$ 5,2 bilhões
A redução da renda do brasileiro e a escalada no preço dos alimentos têm pesado no bolso do brasileiro – sobretudo nos que dedicam a maior parte de seus rendimentos à alimentação.
Nesse
cenário — intensificado pela pandemia do coronavírus –, empresas do segmento
alimentar tiveram de recalcular rota para seguir novas estratégias ou acelerar
planos já existentes.
Um dos
exemplos mais recentes desse movimento foi o anúncio de venda pelo Pão de
Açúcar de 71 lojas do Extra Híper ao Assaí, num negócio de R$ 5,2 bilhões.
Outro é a transformação de 29 lojas adquiridas pelo Carrefour em grandes
estabelecimentos de autosserviço, com a adaptação concluída em junho.
As mudanças
vêm num momento que a perda de poder aquisitivo exige que o consumidor recorra
a soluções mais baratas, como os atacadões, ainda que tenha que renunciar à
diversidade do consumo e da comodidade, explicam especialistas à CNN.
Esse modelo
de negócio tem uma estrutura mais enxuta, com bastante autosserviço envolvido,
o que ajuda na rentabilidade, destaca Fabio Bentes, economista sênior da CNC
(Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo).
“Por ter
essa estrutura mais eficiente, ele consegue oferecer preços melhores. E como a
última década foi muito difícil para o Brasil, algumas redes passaram a
investir neste modelo”, diz.
Um
levantamento feito pela consultoria Nilsen aponta que, em 2020, o segmento de
atacarejo (palavra que junta atacado mais varejo, dois alvos desses negócios)
cresceu 26,7% contra um crescimento de 13% das lojas de supermercados e
hipermercados, ambos impulsionados pelo auxílio emergencial.
Só o
Atacadão, bandeira de cash&carry do Carrefour, cresceu 17% em nove meses de
2021, enquanto as operações de varejo alimentar do grupo caíram 6,6%.
Para Claudio
Felisoni de Angelo, economista e presidente do Ibevar, o movimento de avanço do
atacarejo é mais perceptível nas regiões urbanas e de maior população, onde o
Carrefour concentrou a abertura de novas lojas e onde o Assaí quer ampliar sua
presença.
Mas o
economista destaca que o movimento de crescimento dessa modalidade também
alcança as regiões mais pobres do país. “Já observamos que as principais marcas
e bandeiras de atacarejo do país tem crescido velozmente nessas regiões,
relativamente a outros formatos de varejo”, diz Felisoni.
Apesar
disso, vale ressaltar que o número de hipermercados no país ainda cresce, segundo
a Abras: em 2020, eram 91 unidades, número que mais do que dobrou, para 188,
neste ano.
O consultor
Olegário Araújo, da Inteligência 360, explica que, apesar de os hipermercados
terem perdido a relevância em grandes centros, ainda são muito apreciados em
cidades menores.
Mudança de
comportamento vem antes da pandemia
A inflação e
a queda na renda média do brasileiro vistas durante a pandemia não explicam
sozinhas o avanço dos atacarejos. Silvio Laban, professor do curso de
administração do Insper, diz que o movimento de redução dos super e
hipermercados e o crescimento do cash & carry são anteriores à crise
sanitária.
O modelo de
atacarejo, segundo Laban, começou a ganhar tração há quase uma década, entre
2012 e 2014, pelo fato de o consumidor ter tomado contato com um novo modelo,
que antes ficava restrito a pequenos comerciantes. “Ao longo do tempo, a pessoa
física começou a perceber que poderia ter acesso a alguns produtos, mesmo que
com sortimento limitado de produtos e marcas, mas com economia de preço”, diz
Laban.
Com isso, os
atacarejos passam a ocupar o espaço dos hipermercados, com a proposta de serem
também grandes superfícies com preços mais competitivos que os mercados
menores. Porém, o custo para ter um sortimento maior de produtos e marcas, além
de uma experiência mais refinada na compra, acabaram pesando no custo
operacional desses modelos, que perderam competitividade, diz o especialista.
Cadeias
regionais representam 63% do faturamento do varejo
Um
levantamento da Abras (Associação Brasileira de Supermercados) apontou que as
cadeias regionais representam 63% do faturamento do varejo no país.
Entre elas,
está o Grupo Mateus, o quarto maior player de varejo alimentar do Brasil e que
tem 40 lojas de atacarejo da bandeira Mix distribuídas por cidades do Maranhão
e Pará, algumas delas no interior dos estados.
O grupo foi
beneficiado pela forte participação do auxílio emergencial nos seus resultados,
mas mostrou que seu crescimento não está condicionado à permanência do
benefício pago pelo governo.
Depois de
uma queda na receita para R$ 1,8 bilhão no primeiro trimestre, com o fim do
auxílio, os resultados voltaram para os R$ 2 bilhões no trimestre seguinte. “O
segmento (de atacarejo) é o mais representativo do grupo, com uma participação
de 48% na receita bruta total”, diz o Grupo Mateus, em comunicado.
O
crescimento da receita da sua bandeira de atacarejo do Grupo Mateus foi de dois
pontos percentuais em comparação ao segundo trimestre de 2020. Uma análise do
BTG apontou um crescimento do lucro líquido para os próximos quatro anos de
38%, impulsionado principalmente pelo desempenho das suas lojas de
cash&carry, todas concentradas na região Norte e Nordeste do país.
Outro
exemplo é a empresa paranaense Irmãos Muffato, a quarta maior rede varejista
alimentar do país que, segundo a Abras, concentra 43 de suas 48 lojas Super
Muffato em cidades com menos de 600 mil habitantes – à exceção de cinco unidades
em Curitiba.
Com essa
estratégia, o faturamento da rede cresceu 20,2%, para R$ 9 bilhões, em 2020.
“São os heróis locais. Para as pequenas cidades, se não for no híper, ele não
encontra o que quer comprar”, diz Araújo, ex-Carrefour e GPA.
Fonte: Estadão
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