A dança das areias na foz do rio Paraíba do Sul faz de cada
visita ao Pontal de Atafona, em São João da Barra, uma surpresa. Por esse
motivo, o praticante de kitesurf, José Carlos Mendonça, aproveita o dia da prática
esportiva para fotografar o local. As imagens, além de mostrar um dos mais
bonitos fenômenos da natureza, demonstram um rio fraco, que, com a maré baixa,
não consegue manter a foz larga e profunda, afirmam especialistas. Uma obra de
desobstrução e desassoreamento de dois trechos do rio chegou a ser divulgada
para setembro do último ano, mas segue sem previsão. O fechamento da barra
bloqueou a passagem de embarcações pelo local, mas um canal alternativo, que
apareceu mais ao norte, está sendo usado pelos pescadores.
Segundo o gerente de pesca do município de São João da Barra,
Eleiton Ribeiro Meireles, houve a abertura de um canal secundário entre a ilha
do Pessanha e a ilha da Convivência, permitindo com que os barqueiros do
município continuem tendo acesso ao mar.
— A foz está num processo de assoreamento desde o final da
década de 50, quando foi feita a transposição das águas para o Guandu. Além
disso tem muito desvio de água para irrigação ao longo do trajeto — explicou
Eleiton Meireles.
Em agosto, a Folha trouxe uma matéria sobre as transposições
realizada ao longo do rio Paraíba. Apenas no desvio para o rio Guandu,
realizado na estação de Santa Cecília, cerca de (dois terços) do volume de água
é retirado para abastecimento da região metropolitana do Rio de Janeiro.
O autor de um dos projetos de contenção do avanço do mar em
Atafona, pesquisador e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF),
Eduardo Bulhões, afirmou que pelo local ser um pontal arenoso, ele muda sua
forma constantemente em virtude da movimentação das areias que o compõe.
— A movimentação das areias e, nesse caso, o crescimento do
pontal arenoso se dá sobremaneira pela ação de correntes litorâneas geradas por
arrebentação de ondas. As ondas, junto à praia, transportam areias lateralmente
à praia e isso faz com que o pontal “estique” ou cresça. Nesse caso o
crescimento é para o norte. Durante agosto e setembro, os níveis de vazão do
rio são baixos é a estação de estiagem — afirmou Eduardo Bulhões.
Segundo dados do Comitê do Baixo Paraíba, que monitora o rio
na sua passagem pelo Norte e Noroeste do estado do Rio de Janeiro, em 11 de
agosto de 2019, o rio teve a menor vazão do ano, com 191 m³/s (metros cúbicos
por segundo). Nessa sexta, o valor foi de 216 m3/s. O presidente do órgão, João
Siqueira, ressaltou que o rio está muito fraco pelo quinto ano consecutivo e
falou, ainda, sobre o papel da maré de sizígia nesse aparente recuo do mar, que
ocorre nas luas nova e cheia, quando as forças gravitacionais do Sol estão na
mesma direcção das da Lua, produzindo marés mais altas e mais baixas.
A baixa vazão também foi a explicação do professor e
ambientalista Aristides Soffiati. “A baixa vazão do rio impede que ele mantenha
a foz larga e funda. A profundidade, por sua vez, decorre do assoreamento, que
resulta do desmatamento”, completou.
Sobre os desvios, a Agência Nacional de Águas (ANA) informou
que as regras da resolução conjunta sobre os usos múltiplos das águas do
Paraíba do Sul foram definidas com a participação de órgãos ambientais dos estados
do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, sob mediação do Supremo Tribunal
Federal. A Secretaria de Estado do Ambiente e Sustentabilidade e o Instituto
Estadual do Ambiente informaram, em nota, que acompanham com atenção a questão
da vazão do rio Paraíba do Sul, que tem a competência de gestão federal.
Intervenções no local ainda estão no papel
A desobstrução e o desassoreamento em dois trechos do rio
Paraíba do Sul será realizada a partir de um convênio de cooperação entre a
Universidade Estadual de Rio de Janeiro (Uerj) e a Prumo Logistica. Na época
que a açaõ foi divugada, o Inea informou que foram concedidas licenças para a
“desobstrução de um canal existente em uma ilha para possibilitar a redução da
salinidade da água do rio Paraíba na captação da Cedae no período de preamar (maré
alta), através do direcionamento do fluxo d’água do rio para a margem direita,
tendo em vista que o fluxo principal está na margem esquerda” e também o
“desassoreamento do canal na entrada da foz do Paraíba para permitir a
acessibilidade das embarcações pesqueiras, tanto para descarregar o pescado nos
frigoríficos e retornar ao mar, como realizar as ancoragens e manutenção nos
portos e estaleiros existentes na margem direita, próximo à foz”.
Em nota, a Prumo afirmou que a fase de estudos prévios e monitoramento
ambientalpara possibilitar a execução de obras de desassoreamento de trechos da
foz do Rio Paraíba do Sul foi concluída pela Uerj. “Em paralelo, está em curso
o processo de contratação da empresa que será responsável pela execução das
obras. Uma vez terminada a concorrência, os trabalhos poderão ser iniciados com
os recursos financeiros já disponibilizados pelo termo de compromisso firmado
entre a Porto do Açu Operações, Prefeitura do Município de São João da Barra e
Secretaria Estadual de Ambiente e Sustentabilidade”, completou.
Também estão sendo discutidos projetos para contenção do mar
em Atafona. Em 2014, o primeiro foi apresentado pelo Instituto Nacional de
Pesquisas Hidroviárias (INPH) ao então prefeito de São João da Barra, José
Amaro Martins de Souza, Neco. Ele prevê a construção de um quebra-mar e tem
valor estimado em R$ 180 milhões. Em abril deste ano, um novo projeto, que
prevê a transposição de areia para a praia como solução, foi discutido em
audiência pública. A obra não criaria estrutura fixa e custaria cerca de R$ 20
milhões. A prefeita Carla Machado falou na ocasião, que o município poderia
pagar sem precisar de recursos dos governos federal e estadual. O município
informou, em nota, que estuda a viabilidade das propostas.
FOLHA 1
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