'Se nada
mudar, eu vou recomendar ao governador que decrete a quarentena, o chamado
lockdown', afirmou Arthur Virgílio Neto
BRASÍLIA - O
prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB) disse que tanto ele quanto o
governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), fracassaram ao implementar medidas
de distanciamento social na capital e no estado.
Segundo o
Ministério da Saúde, o Amazonas é o que tem a maior taxa de incidência da
doença em todo o Brasil. São 5.224 casos confirmados e 425 mortes. Segundo
Arthur, Manaus vive hoje "cenas de filme de terror".
Em
entrevista ao GLOBO, o prefeito critica a velocidade da ajuda do governo
federal à cidade, diz que parte da responsabilidade pela não adesão da
população ao distanciamento é do presidente Jair Bolsonaro e diz que, se nada
mudar, ele vai recomendar a Lima que decrete o chamado "lockdown",
que implica no fechamento total de todas as atividades comerciais da cidade e o
confinamento das pessoas em suas casas.
O Amazonas
tem condições, hoje, de, sozinho, sair da crise de saúde em que está?
Não. Sem o
governo federal nos ajudar, não temos como sair dessa crise. Tem que ter uma
presença federal muito forte, que a gente não vem percebendo.
O senhor é a
favor de uma intervenção federal na saúde do estado?
Veja... eu
não quero entrar em atrito com o governo do estado. Acho que a situação pode
ser resolvida se o governo federal mandar o que a gente precisa por aqui, o que
ainda não aconteceu.
Como o
senhor avalia as ações do governo federal para atender a crise no Amazonas?
Na área da
saúde, está horrível. Eu não vi nada, ainda. Estamos aguardando ansiosamente a
chegada de aviões Hércules das Forças Armadas com EPIs, respiradores, macacões,
insumos que a gente precisa para atender a gente. Está faltando medicamento.
Nós estamos racionando remédios. Na época do (ex-ministro da Saúde Luiz
Henrique) Mandetta, ele até se fazia presente, mas agora, minha esperança é que
o general (Eduardo Pazuello), que conhece a região, possa nos ajudar. Eu estou
preocupado porque vi um vídeo com o atual ministro (Nelson Teich), no qual ele
fala sobre um dilema entre ajudar um idoso ou um jovem. Eu fico me perguntando:
será que vamos ter que chegar a esse ponto e ter que dar ao médico o poder de
Deus para escolher quem vive e quem morre?
A crise
afetou, também, os serviços funerários. Que medidas vocês estão tomando para
evitar um caos nos cemitérios?
Essa
situação pegou todo mundo de surpresa. Estávamos numa crise entre parentes de
vítimas e os coveiros porque muitos deles estavam trabalhando e caíram doentes.
Estão fazendo um trabalho hercúleo. Reforçamos o número de equipes que estão
trabalhando lá e colocamos tendas com padres e pastores para darem conforto às
famílias. Antes dessa epidemia, a gente enterrava 30 pessoas por dia, em média.
Ontem (segunda-feira), enterramos 142, das quais 28% morreram em casa. É quase
um terço. Não sei se essas pessoas morreram porque se automedicaram, não
tiveram acesso atendimento ou se porque acharam que, como disse o presidente,
era só uma gripezinha. É um negócio sinistro, mesmo. A gente está vendo cenas
de filme de terror.
Para quando
está previsto o pico da doença em Manaus?
Nossos
estatísticos estimam que o pico deve acontecer na segunda semana de maio.
Apesar dos
números e das imagens, Manaus continua
sendo uma das capitais com baixa adesão ao isolamento social. Por que o senhor
acha que a população da cidade não aderiu a essas recomendações?
Acho que há
um fator cultural. Meu secretário de obras anda pelas periferias e ouve as
pessoas dizendo que a Covid-19 é doença de rico, que não vai pegar em pobre, no
caboclo. Mas elas estão vendo as pessoas morrendo. Outro fator é a pregação do
presidente Jair Bolsonaro contra essas medidas. Ele diz que precisamos salvar a
economia, mas nunca vi salvar a economia com gente doente. A realidade é que eu
fracassei em relação ao distanciamento social. Fracassei assim como o
governador e todo mundo que está a favor do distanciamento social. Fracassamos
perigosamente. Por isso que vamos, ainda nesta semana, dar início a uma
campanha de mídia pesada para tentar convencer as pessoas a aderirem ao
isolamento.
Se não
houver aderência ao distanciamento social e se a ajuda para ampliar a
capacidade de atendimento não chegar a tempo, o que senhor avalia que vai
acontecer em Manaus?
Se nada
mudar, eu vou recomendar ao governador que decrete a quarentena, o chamado
lockdown. Fecha tudo. Radicalizar mesmo. Vamos salvar as pessoas mesmo que elas
não queiram ser salvas. Lá na frente, elas vão poder avaliar se tomamos as
medidas certas ou não. Mas primeiro elas precisam estar vivas.
FONTE: LEANDRO PRAZERES - O GLOBO
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