Bernardo Joaquim da Silva Guimarães, o então conhecido
Bernardo Guimarães, atuou como jornalista, magistrado, professor, romancista e
poeta. No entanto, pode ser considerado um daqueles ficcionistas reconhecidos
pelo maior público apenas por uma de suas obras, pois, embora tenha escrito
nove romances, o único ainda lido e publicado regulamente é “A Escrava Isaura”.
Romance que possui como título o nome de sua personagem principal, a mocinha
sofredora, heroína da história, Isaura, uma escrava aparentemente branca, que
nasceu em uma bela e suntuosa fazenda no município de Campos dos Goytacazes,
tendo como pais o português Miguel, feitor da fazenda, e a escrava Juliana,
descrita como mulata que havia sido explorada sexualmente pelo comendador, o
Sr. Almeida, dono da fazenda e pai de Leôncio.
O que há de tão encantador na história? As páginas desse
romance estão impregnadas de memória, que remete o leitor ao século XIX,
durante o reinado de D. Pedro II, período marcado pela difusão de movimentos
abolicionistas no país, os quais ganharam força em todo o país, conquistando
adeptos e mobilizando intelectuais como Bernardo Guimarães, que acabou
refletindo nesta obra, o pensamento da elite intelectual abolicionista de seu
tempo.
“A Escrava Isaura” foi publicada pela primeira vez em versão
de folhetim, no jornal Constitucional de Ouro Preto, e sua primeira edição em
livro só veio a público em 1875. Diversos são os palpites sobre o grande
sucesso editorial do livro, como a astúcia de Bernardo Guimarães ao descrever
Isaura como branca, tocando fundo na ferida ao colocar uma branca para sofrer o
tanto que as negras escravas sofreram com a escravidão, chamando a atenção e
provocando questionamentos sobre a sociedade escravista de sua época.
A obra ficou eternizada na adaptação para novela na Rede
Globo de Televisão, por Gilberto Braga, na década de 1970. Nesta adaptação,
Isaura foi interpretada pela atriz Lucélia Santos, papel que marcou sua
carreira. Essa adaptação tornou propícia à construção e a perpetuação da imagem
da personagem no imaginário popular campista, chegando até possuir endereço
fixo em nossa cidade.
A casa da escrava Isaura se chama Solar dos Ayrizes e fica no
Norte do estado do Rio de Janeiro, na cidade de Campos dos Goytacazes, mais
precisamente situada, na BR 356, em Martins Lage. O auge do ciclo da
cana-de-açúcar marcou a cidade de Campos dos Goytacazes deixando aos nossos
dias testemunhos deste tempo nos casarões e solares, remanescentes na região. O
Solar Ayrizes ou casa da escrava Isaura, como é mais conhecida, foi construído
em 1840, pelo Claudio do Couto e Souza, um belo e esplêndido exemplar de uma
arquitetura que fazia questão de ostentar o poder aquisitivo de seu
proprietário.
Supostamente Bernardo Guimarães foi inspirado pelos ares do
solar quando escreveu “A Escrava Isaura”. Campos dos Goytacazes, no século XIX,
era uma cidade destacada das demais do Estado do Rio de Janeiro, devido à
atividade açucareira sendo considerada de grande prestígio.
O Solar Ayrizes foi algumas vezes, usado como locação para a
produção da novela, e os campistas levaram tão a sério a história da escrava
Isaura, que absorveram como realidade, que até a incorporaram no folclore
local, argumentando que Isaura continua na sua residência. Reza a lenda que ela
não só viveu no lugar, mas que o seu espírito ainda vaga nas imediações do
solar.Tudo leva a acreditar que a personagem não teria realmente existido,
pois, não há indícios de que o autor tenha estado na região de Campos ou que
tenha existido alguma Isaura por aqui. Pelo menos, não existe documento que
comprove sua existência, a não ser a obra literária, considerada uma história
de ficção.
Hoje, a casa da escrava Isaura, ou seja, o Solar Ayrizes é um
patrimônio da cidade tombado pelo IPHAN, atraindo turistas que procuram algum
vestígio da escrava Isaura ou que queiram saber sobre o famoso historiador
Alberto Lamego, que recebeu este imóvel de herança, tendo residido por um longo
tempo no local. Apesar da sua importância histórica o Solar Ayrizes, tem
resistindo ao tempo, carecendo emergencialmente de uma restauração, necessidade
esta que por enquanto não é cumprida.
Por Graziela Escocard – Historiadora e Diretora do Museu
Histórico de Campos dos Goytacazes.Instagram: @grazi.escocardE-mail:
grazi.escocard@gmail.comCel.: 22 999391853
Nenhum comentário:
Postar um comentário