Conheça a vida do carioca que revolucionou o esporte radical no Brasil. Visionário, ele foi, por 38 anos, o único surfista do país a ter chegado a uma final de Pipeline. Como atleta de voo livre, Pepê conquistou o inédito mundial em 1981, feito que nenhum outro brasileiro conseguiu repetir
Quinta-feira, 4 de abril de 1991. Campeão mundial de voo
livre 10 anos antes, Pedro Paulo Guise Carneiro Lopes sofre um acidente em
Wakayama, no Japão, e morre após chocar-se com uma estrutura rochosa e agonizar
por duas horas e meia antes da chegada do socorro. O Brasil perdia ali, com
apenas 33 anos, um atleta que marcou época. Mais do que isso. Pepê, como era
conhecido, é considerado um visionário do esporte radicial brasileiro, deixando
o seu profissionalismo e a sua competitividade como legados para as futuras
gerações.
FEITO HISTÓRICO NO SURFE
Antes de ganhar o Mundial de Voo Livre, o carioca de Ipanema
foi surfista de destaque no cenário nacional e internacional. Em 1976,
tornou-se o primeiro brasileiro a ganhar uma etapa do Circuito Mundial, feito
ocorrido no Waimea 5000, no Arpoador. Naquele mesmo ano, Pepê também passou a
ser o primeiro surfista do Brasil a chegar a uma final de Pipeline. Para se ter
uma noção do tamanho do feito, o país só voltou a ter um finalista na
competição havaiana em 2014, com Gabriel Medina.
- Não tive a oportunidade de conhecer o Pepê Lopes, mas sei
que ele foi muito importante para o surfe no Brasil. Valorizo muito pessoas
como ele, que fazem a diferença, seja dentro ou fora do esporte. E tenho
certeza de que se ele ainda estivesse aqui com a gente, seria um prazer enorme
conhecê-lo e surfar com ele - disse Gabriel Medina.
Campeão mundial na mesma Pipeline em 2015, Adriano de Souza,
o Mineirinho, é outro a destacar a importância de Pepê Lopes para o surfe
brasileiro. Ele também ressalta a relevância do carioca na divulgação do seu
estilo de vida saudável e da implantação do empreendedorismo no esporte.
- Pepê foi fundamental para dar uma ênfase internacional ao
surfe brasileiro. Ele foi finalista em Pipeline, uma etapa super tradicional,
sendo pioneiro em colocar o Brasil em destaque. E não foi só isso. Em toda a
vida dele, ele foi pioneiro, seja no surfe ou na asa delta. Sem contar que ele
levava uma vida muito saudável e desenvolveu esse estilo de vida, deixando como
legado para todos os atletas - comentou Mineiro.
QUEM FOI PEPÊ LOPES
Filho do casal Manuel Danton Carneiro Lopes e Vera Guise
Carneiro Lopes, Pepê teve outros três irmãos e foi criado em Ipanema, Zona Sul
do Rio. Seu primeiro esporte foi o hipismo, o qual começou a praticar ainda na
infância no Floresta Country Club, no bairro do Itanhangá. Como cavaleiro foi
campeão carioca mirim antes de descobrir o surfe - ele também chegou a praticar
judô e natação na infância. Ainda garoto começou a surfar em Grumari, seu
primeiro point. Pouco depois, quando surfava no antigo píer de Ipanema, Pepê
conheceu Rico de Souza, que já era famoso no cenário do surfe brasileiro
naquela época.
Impressionado com o talento do jovem de cabelos louros e
sorriso fácil, Rico logo virou amigo e companheiro de onda de Pepê. A amizade
fez ambos progredirem na modalidade, e, em 1976, com apenas 19 anos, Pepê viveu
o seu auge no surfe ao ser campeão de uma etapa do antigo Circuito Mundial, o
Waimea 5000, no Arpoador. Naquele mesmo ano, o carioca também disputou o Pipe
Masters e chegou à final, um acontecimento impensável para uma época em que os
brasileiros mal conheciam as ondas do Havaí.
- O Pepê sempre foi um grande ídolo, um grande atleta em
todos os esportes que disputou. No surfe, ele representou muito bem, não só
como surfista, mas como pessoa, porque era um ser humano muito correto. Pepê
foi um ídolo que inspirou muitas gerações. Tive o prazer de conviver com ele,
fiz pranchas para ele e sou amigo da família até hoje. É como se o Pepê
estivesse vivo até hoje, porque esse legado e esse carinho dele nunca foram
apagados - afirmou Rico.
Rico também acredita que o sucesso de Pepê tenha contribuído
bastante para a desmarganização do surfe no Brasil. Perseguidos até então pelo
regime militar, os surfistas passaram a ser olhados de uma outra maneira após
as conquistas do carioca de Ipanema.
- O resultado que ele teve em Pipeline em 1976 abriu as
portas para o Brasil. Aquele feito contribuiu e muito para que o surfe se
profissionalizasse. Foi o pontapé inicial para que surgissem grandes gerações
nos anos seguintes, principalmente essa geração vitoriosa que temos agora, a
Brazilian Storm - opinou.
Apesar do sucesso no surfe, Pepê não se deu por satisfeito.
Querendo experimentar cargas de adrenalina ainda maiores, ele migrou para o voo
livre no fim dos anos 70. Como piloto de asa delta, chegou ao ápice em 1981 ao
ser campeão mundial Wakayama, no Japão, mesmo local onde ele viria a ter o
acidente fatal 10 anos depois.
- Pepê foi um marco para o voo livre brasileiro. Graças ao
título mundial do Pepê, o voo livre brasileiro deu um passo muito grande para o
seu reconhecimento como esporte. Conheci o Pepê quando éramos surfistas e
migramos para o voo livre em 1978. Ele era um grande amigo meu. A perda dele
foi irreparável - destacou o hoje instrutor de voo livre, Miguel Tavares.
ACIDENTE GRAVE EM 1984 E MORTE EM 1991
A conquista do Mundial de 1981 não encerrou a sede de títulos
de Pepê, que seguiu competindo em alto nível pelos anos seguintes. Em 1984,
porém, ele viu a morte de perto pela primeira vez durante competição em
Governador Valadares (MG). Ao tentar fazer pouso forçado, Pepê sofreu grave
acidente, que o fez perder o baço. Após 40 dias de internação na cidade
mineira, recebeu alta e voltou para o Rio. Seu estado de saúde, contudo, não
era nada animador.
- Ele estava tendo febre direto e estava muito debilitado.
Chamamos um médico amigo nosso, o Antônio Gondin, que o examinou e constatou
que ele deveria ser internado às pressas. Ao chegar ao hospital, o especialista
de lá descobriu que ele estava com um rim necrosado. Precisava ser operado às
pressas e, mesmo assim, era uma cirurgia delicada. Felizmente, conseguiu
sobreviver, após ter um rim retirado. Foi um verdadeiro milagre - revelou o pai
de Pepê, Danton Carneiro Lopes, em entrevista em 2011. Manoel Danton faleceu em
2018.
O susto não freou o ímpeto do atleta. Mesmo com apenas um
rim, Pepê continuou competindo em alto nível. O que ele não esperava, porém, é
que o destino lhe reservara. No dia 4 de abril de 1991, um acidente durante o
Mundial de Asa Delta, em Wakayama, no Japão, levou seu bem mais precioso: a
vida.
Anos antes, a família já havia pedido para o atleta abandonar
as competicões. Segundo relato de amigos, Pepê prometera aos pais e à esposa,
Ana Carolina, que aquela seria a sua última competição. Para a infelicidade de fãs
e amigos a promessa se realizou. Mas de uma maneira trágica.
- Recebemos a notítica pelo pai da Carolina, que nos ligou e
disse que precisava vir aqui em casa urgentemente. Ele veio aqui com o pai do
amigo do Pepê, que havia viajado com ele para o Japão. Quando eles nos deram a
notícia, a frente do nosso prédio já estava cheia de fãs – contou Danton.
EMPREENDEDORISMO E LEGADO
Além de multiatleta, Pepê também foi um empreendedor. Com
oito anos de idade, ele já era comerciante, produzia e vendia sabonete líquido
para a vizinhança em Ipanema. Depois, ele passou a consertar pranchas e, aos
13, já viajava com o próprio dinheiro. Aos 17 anos, quando já morava sozinho,
Pepê fundou a sua barraca de lanches ao perceber a necessidade de o carioca ter
uma alimentação saudável na praia. Uma de suas criações, o sanduíche natural,
até hoje faz sucesso no Rio.
Após a sua morte, o trecho da praia em frente à sua barraca
passou a ser chamado de Praia do Pepê, uma extensão da Praia da Barra da Tijuca.
A avenida em frente ao local também recebeu o nome do atleta. Pepê também foi
dono de um restaurante de comida japonesa no Leblon. Tanto a barraca quanto o
restaurante são administrados até hoje pela família do lendário carioca, que
foi casado com Ana Carolina Gayoso com quem teve os filhos Bianca e João Pedro.
Em 2011, nos 20 anos da morte de Pepê, foi inauguarada uma
placa em homenagem ao campeão mundial de voo livre, próximo à Praia do Pepino,
em São Conrado. O local abriga a principal pista de pouso de asa deltas do Rio
de Janeiro, um local com as bençãos, com a marca e com parte da alma do eterno
campeão.
FONTE:GE
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