Fares (e) e o sócio Mesquita, da Brazil Kombi, vão exportar 100 unidades este ano Foto: Wilton Junior/Estadão
Dono de uma
empresa de trading há cerca de 20 anos, Alexandre Fares intermediava
importações e exportações de diversos produtos como alimentos, vestuários e
peças para carros. Em 2016, recebeu um inusitado pedido de um alemão. Embarcar
uma Kombi adquirida em São Paulo, onde ele tinha passado o carnaval daquele
ano.
“Era um
lixo”, define Fares, que assim mesmo providenciou a documentação e exportou a
Kombi com mais de 30 anos, via Porto de Santos rumo à Alemanha. No mesmo ano,
Björn Augustin, o alemão, contratou os serviços de Fares para o envio de mais
dez Kombis que encontrou em anúncios brasileiros, a maioria em estado de
conservação bem ruim.
O cliente
reformava os veículos e os revendia. Segundo Fares, a perua da Volkswagen tem
muitos admiradores no país onde nasceu em 1950 (e morreu no fim nos anos 70),
mas praticamente não há mais modelos disponíveis à venda. “Há pessoas
alucinadas pela Kombi; algumas são colecionadoras, outras são pessoas que
gostam do modelo e usam para levar a família para passear no fim de semana ou
usam como motorhome”, afirma o empresário.
Indicado por
Augustin, Fares passou a receber mais pedidos da icônica Kombi, modelo que
começou a ser produzido no Brasil por 56 anos. Saiu de linha em 2013 como o
carro mais longevo no mundo.
Em 2017,
Augustin sugeriu a Fares que fizesse o trabalho de restauração, em vez de
exportar os veículos nas condições em que eram compradas. Ele suspendeu as
atividades da trading para se dedicar ao negócio de compra e reforma de peruas,
junto com o sócio Paulo Victor Mesquita, de 35 anos, dono de uma empresa de
prestação de serviços de despachante no Porto de Santos – que também fechou
para cuidar exclusivamente das exportações de Kombi.
Juntos
fundaram a Brazil Kombi, com sede e oficina em Duque de Caxias (RJ) e
exportaram, até agora, mais de 350 Kombis para 15 países. O negócio cresce ano
a ano e, em 2021, atingirá volume recorde de 100 unidades. Os compradores são
de países como França, EUA, Inglaterra, Austrália, Líbano e Porto Rico, além da
Alemanha, o maior comprador. Entre eles há empresas de turismo e de locação de
carros para casamentos e eventos.
Reforma pode levar até um ano – A reforma de uma Kombi leva em média três
meses, mas há casos em que chega a um ano, em especial as customizadas. A
empresa entregou no ano passado uma versão chamada de Herbie – com cores e
adereços que remetem ao filme “Se meu Fusca falasse”. Outra teve de ser pintada
de preto a amarelo, porque o comprador é torcedor do time alemão Borussia
Dortmund. Na opinião de Fares, “ficou horrorosa”.
A mais cara
vendida até agora foi uma Kombi 1958, versão considerada muito rara, que
precisou de várias reformas e foi entregue a um comprador da Austrália por € 38
mil (R$ 238 mil pela cotação atual).
Feres tem 46
anos, sempre atuou na área de comércio exterior e em meados dos anos 80
trabalhou no Ministério do Desenvolvimento. Nunca teve uma Kombi e às vezes
tenta ficar com algum dos modelos que reforma, mas sempre aparece uma boa
oferta e acaba vendendo.
No início
das operações da nova empresa, ele e o sócio rodavam o Brasil inteiro a procura
de Kombis com mais de 25 anos (idade mínima permitida para a exportação dos
carros considerados raridades para os EUA) e acima de 30 anos para a Europa e
outros países.
“Encontramos
um Kombi jogada num curral de bois em Piedade de Caratinga (interior de Minas
Gerais), muito ruim e tivemos praticamente de trocar tudo; deu muito trabalho,
mas ficou ótima”, lembra Feres, ao contar de experiências nas andanças em busca
de peruas.
A história
que mais marcou, diz ele, foi em Caratinga, também em Minas, há cerca de três
anos. “Compramos uma Kombi 1969 de um casal, branca, muito bem conservada;
quando estávamos saindo, os donos, ambos na casa dos 80 anos, começaram a
chorar muito.”
A senhora
contou que eles tinham passado a lua de mel na Kombi. E o senhor disse que não
era veículo de um único dono, mas de um único motorista: não deixou ninguém
dirigi-la, nem mesmo os filhos. Como nos últimos anos a Kombi estava encostada,
porque ele não podia mais dirigir, decidiu vendê-la porque não queria ver o
veículo se acabar ali. “Me deu muita pena trazer o carro”, diz Feres.
Atualmente,
ele e Mesquita não precisam mais garimpar Kombis Brasil afora. Eles se tornaram
conhecidos no mercado e agora muitas pessoas oferecem os veículos, mandam fotos
e alguns compram os veículos para revender para a empresa.
Mão de obra
para restauração é gargalo – A oficina
em Duque de Caxias tem 13 funcionários que trabalham na restauração. A mão de
obra é o principal gargalo da Brazil Kombi. “É muito difícil conseguir mão de
obra especializada”, afirma Feres. “Não fosse isso, poderíamos restaurar muito
mais veículos, mas hoje dispensamos clientes por não termos condições de
atender.”
Recentemente,
a empresa passou a restaurar outros modelos, como Fusca, Brasília, Variant,
SP2, Saveiro e Land Rover. “Em geral, nossos clientes têm paixão por carros da
Volkswagen com motor a ar, mas ainda não descobri a razão”, diz o empresário. A
empresa estuda, no momento, abrir uma unidade na Alemanha ou EUA para venda dos
veículos e peças.
As novas
regras que estabelecem o fim da produção de carros a combustão na Europa e
outros países nos próximos anos não devem ter impacto nos negócios, acredita
Feres. Por serem considerados raridade, os modelos antigos continuarão podendo
circular, ainda que tenham restrição em alguns locais. Na era dos elétricos,
ainda haverá mercado para a velha e poluidora Kombi.
Até 2013,
foram vendidas no Brasil 1,55 milhão de Kombis, das quais 1,2 mil da versão
‘Last Edition’, feita para sua despedida, que teve ainda publicação de um
testamento e filme na TV com o retorno da última unidade “voltando para
casa” – um museu na Alemanha. Uma nova e
tecnológica perua elétrica, descedente da Kombi, será lançada em breve pela
Volkswagen com o nome de ID.Buzz.
(Com o
Estado de São Paulo)
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