Empresários e psicanalista analisam correria por ingressos a partir do momento que público pôde voltar a viver a experiência do show ao vivo
Depois de mais de um ano e seis meses, o mercado do entretenimento volta a ficar movimentado com uma rapidez impressionante no Brasil. Ingressos para shows e festivais esgotam em minutos — independentemente do preço, do lugar e do tamanho da casa de show.
A euforia deste momento de retomada é celebrada pelo setor, um dos mais afetados pela paralisação completa das atividades com a pandemia, mas já era de alguma forma esperada.
"Os
primeiros shows estão surfando essa onda da demanda represada", explica
Marco Antônio Tobal Junior, sócio-diretor do Espaço das Américas, do Expo Barra
Funda e do Villa Country.
"Acho
que todo mundo sentiu falta dessa experiência durante o período de pandemia.
Então quando a pessoa vê o show de um artista que é do desejo dela, ela compra
de forma muito rápida e automática", continua.
Além do
desejo do público, os artistas lançaram álbuns e projetos durante a pandemia, o
que faz com que o timing para novas turnês seja perfeito neste momento.
Exemplos bem
sucedidos são: o cantor paulista Jão que esgotou duas datas no Espaço das
Américas, cerca de 16 mil ingressos ao todo, para a turnê em 2022 do álbum
"Pirata", além das outras datas pelo Brasil.
Marina Sena,
a revelação do pop brasileira deste ano, abre data atrás de data, mas mesmo
assim ainda falta ingresso para vê-la.
Mesmo com o
valor do ingresso elevado, o Rock in Rio vendeu 200 mil ingressos antecipados,
e o Lollapalooza não tem mais ingressos disponíveis.
Vale fazer
uma ressalva que, no caso dos shows adiados, como o Lolla, a sensação de que
esgotou muito rápido não é tão real porque a maioria dos ingressos já estava
vendida.
Isso sem
contar no segmento do forró e da pisadinha com artistas que surgiram na
pandemia, no meio digital, e que só depois de meses saíram em turnê e encontram
grandes multidões pela frente.
'Vai faltar
dia em 2022'
O grande
desafio atual é arrumar a agenda, seja dos artistas ou das casas de shows.
Partindo do princípio que há eventos adiados desde 2020 que precisam ser
remarcados, o cenário para 2022 é de grande expectativa.
"A
sensação que tenho é que vai faltar dia em 2022", diz Lucas Giacomolli,
vice-presidente da Opus Entretenimento, que administra o teatro Bradesco em São
Paulo e outras nove casas pelo Brasil.
"Ninguém
quer mais deixar para depois. O público está desejando garantir o ingresso, o
melhor lugar e estar presente".
"As pessoas estão buscando o momento de retomar as atividades, então planejar a compra de um show distante (para o próximo ano, em outra cidade) não é mais um problema", afirma Giacomolli.
Na visão dos
dois empresários, o ano de 2022 pode ser o melhor para o setor dos últimos 15
anos, se nenhum outro fator externo voltar a interferir no mundo.
"Brinquei
que vai faltar dia, mas essa é a nossa sensação... já temos programação para
2023".
O que
explica essa euforia coletiva?
Para
Christian Dunker, psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP),
a correria pelos shows está associada ao tempo durante o qual as pessoas foram
privadas da catarse da coletiva.
"O desejo humano depende do desejo do outro e da falta. Aquilo que você perde rapidamente adquire um valor que você não conseguia dar àquilo que você tinha. Isso vale para um grande amor para a vida, para a liberdade", diz Dunker.
"A proporcionalidade da falta é a proporcionalidade da intensidade do desejo. Essa é uma propriedade geral do desejo humano."
"Os
shows estão esgotando rapidamente, porque há um revival do que teria sido o
carnaval de 1919, depois da Guerra e depois da Gripe Espanhola, em que você tem
um desejo ardoroso de encontrar as pessoas, viver estados de multidão, de
retomar a vida e comemorar a sobrevivência, o final da pandemia", diz
Dunker.
É difícil
mensurar por quanto tempo essa busca por viver intensamente o entretenimento
vai perdurar até porque são escolhas individuais.
"O período de euforia é correlato ao quanto a gente aguenta de festa, mas penso que, no nosso caso, essa euforia deve durar até a retomada de um certo cotidiano e eventualmente até as eleições", conclui Dunker.
De onde vai sair tanto dinheiro?
Por mais que
as pessoas queiram muito ir a todos os shows possíveis, a conta chega no final
do mês até porque os ingressos voltaram com preço mais altos em relação ao
período anterior à pandemia.
E nunca é só o ingresso, se gasta com bebida, com deslocamento, basicamente com o simples fato de colocar o pé para fora de casa.
Como tudo
está relacionado com a economia do país, os custos para fazer os eventos também
aumentaram.
"Inflação
e o custo de todas as operações estão subindo, o próprio valor do dólar para
trazer atrações de fora não para de aumentar. O mesmo show de 2019 custa, hoje,
duas vezes o valor", afirma Tobal Júnior.
É por isso
que ele acredita que essa busca incessante pelos shows pode ter um prazo de
validade.
"Por enquanto, prevalece o fato de que está todo mundo a fim de assistir shows que não aconteceram, mas alguma hora esse aspecto econômico vai afetar e vai ser um problema que todo mundo vai ter que encarar", analisa. (leia mais abaixo)
"De
repente cobrar ingressos mais baratos ou encontrar maneiras de fazer a operação
de forma mais enxuta. A gente observa uma certa deterioração do poder econômico
das pessoas e isso vai dar um choque que vai afetar o mercado com
certeza".
Fonte: G1
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