Eles lembram do crescimento econômico na região à série de demissões na antiga fábrica de cimento
“Nós éramos
uma grande família, não pagávamos conta de água, de luz, nem aluguel. Todo
mundo se conhecia e ganhava bons salários na fábrica. Depois, a gente só via
choradeira. Muito ‘chefe de família’ teve que mudar de profissão ou se mudar
daqui e muitos entraram em depressão”. As palavras são do aposentado Altino dos
Santos que, aos seus 75 anos, lembra com ar nostálgico de como era o bairro de
Cimento Paraíso, em Italva, na época em que a fábrica do mesmo nome estava em
pleno funcionamento e quando ela passou por uma demissão em massa.
A história
da Companhia Cimento Portland Paraíso, que hoje chama-se Calcário Paraíso e
produz apenas calcário, pode ser facilmente confundida com a dos
ex-trabalhadores que ainda moram na antiga vila nos arredores da indústria. A
reportagem do Terceira Via esteve no local e conversou com três ex-funcionários
que acompanharam o desenvolvimento e o encerramento da produção de cimento na
cidade.
A história
da fábrica começa na década de 40, quando Italva ainda fazia parte do
território da cidade de Campos. A Cimento Paraíso foi a 2ª fábrica do estado do
Rio de Janeiro e a 10ª no Brasil e é considerada grande responsável pelo
desenvolvimento naquela região.
“Tinha uma
fábrica pequena aqui que fechou e foi leiloada, aí os novos donos perceberam
isso e compraram. Eles começaram a produzir cimento com dois fornos americanos
pequenos comprados de segunda mão. Em 1950 eles tinham mais dois fornos grandes
e aí foi só crescimento”, lembra Altino dos Santos.
O cenário do
bairro naquela época era composto por várias casinhas pequenas, ruas de chão e
ambiente familiar. O local parecia desenvolver-se mais rápido do que o restante
da cidade e tinha igrejas, time de futebol, e até um cinema (atualmente
abandonado). A Fábrica Cimento Paraíso tinha cerca de 600 funcionários e vendia
cimento para várias cidades, inclusive de outros estados.
“Lembro que
na minha época todos os funcionários da fábrica eram homens, só duas mulheres
trabalhavam como enfermeiras. Tudo o que eu sei na vida eu aprendi lá”, contou
o aposentado Zeno Mendonça, de 86 anos.
Ainda na
década de 40 a ponte Governador Edmundo Macedo Soares, que corta o Rio Muriaé,
foi inaugurada. Isso colaborou ainda mais com crescimento econômico da região,
já que antes a travessia era feita com ajuda de canoeiros.
“Na época
que a fábrica funcionava, aqui era mais movimentado e nossos salários eram
muito bons. Operários ganhavam uns cinco salários mínimos. Os donos eram ricos
demais e ajudavam a gente com várias despesas, além de pagar o salário. Sou
filho de operário da fábrica, comecei a trabalhar lá com 14 anos e fiquei por
quase 25 anos”, lembrou o aposentado João do Couto, 61 anos.
DEMISSÕES EM
MASSA:
Foi na
década de 60, no período próspero da região, em que começaram as conversas
sobre a emancipação de Italva. Anos depois, em 1982, a fábrica parou de
produzir cimento e demitiu grande parte dos seus funcionários. Já em 1986,
quando a emancipação enfim aconteceu, Italva já vivia uma época em que muitos
desempregados haviam saído para buscar oportunidades em outras cidades.
“Quando lá
parou de produzir cimento, eu saí da cidade para procurar emprego. Nesta época,
eles venderam as casas pra gente por um preço bem barato, porque a gente morava
nas casas da fábrica de graça e se não fosse assim, íamos ficar sem teto”, João
do Couto, 61 anos.
Dos cerca de
600 funcionários mantidos pela fábrica, restaram apenas cerca de 150 após as
demissões. Segundo os ex-funcionários, o encerramento da produção de cimento
teria várias causas, como a não modernização, a morte de um dos
donos e até dificuldade em encontrar minério no local. O que sabe-se é que as demissões surpreenderam centenas de famílias.
“Eram mais
de 100 demitidos de uma só vez e nas vilas era muita ‘choradeira’. Tinha muita
gente desempregada ao mesmo tempo e foi muito triste porque ninguém esperava
isso. Nesta época, Italva já tinha se emancipado de Campos e muitos saíram
daqui para procurar emprego. Eu fui ficando e saí da fábrica em 1995 porque eu
fiquei adoentado”, contou Altino.
Em 1996 o
grupo Holcim comprou a fábrica, que atualmente chama-se Calcário Paraíso. A
extração é feita de jazidas nos arredores e segundo a empresa, ainda restam 120
milhões de toneladas de material para serem extraídas. Enquanto isso, logo ao
lado, os ex-funcionários da antiga fábrica de Cimento Paraíso ainda moram no
local e vivem de boas lembranças no pacato distrito de Cimento Paraíso.
“Aqui parece
que andou pra trás, porque tinha tudo para evoluir, mas quando parou de
produzir cimento, o crescimento também desacelerou. Gosto de morar em um lugar
tranquilo, não tem quase ninguém na rua”, contou João do Couto.
Fonte:Priscilla
Alves
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