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18/04/2022

CONCESSÃO DO BPC PODE DEMORAR ATÉ 11 MESES NO INSS

 



BRASÍLIA e RIO – O prazo para a concessão do benefício assistencial a pessoas com deficiência de baixa renda é de quase um ano. Segundo dados oficiais obtidos pelo EXTRA, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) demora, em média, 11 meses e três dias para reconhecer o direito ao Benefício de Prestação Continuada (BPC/Loas) para esse segmento, um dos mais carentes da população.

 

Quem entra com pedido de aposentadoria por invalidez também precisa esperar, em média, por quase sete meses pela concessão do benefício. Estes prazos ferem o acordo firmado com o INSS no Supremo Tribunal Federal (STF). O acordo estabelece prazos de 30 a 90 dias para a concessão de benefícios. No entanto, os BPCs e demais benefícios que necessitem de perícia médica ficaram de fora.

 

— Os segmentos mais vulneráveis como pessoas com deficiência e trabalhadores que dependem do auxílio-doença, por exemplo, continuam sendo os mais prejudicados por causa da necessidade de avaliação médica e social presencial — afirmou a defensora pública federal, Fernanda Hahn, que faz parte do comitê gestor de acompanhamento do acordo no Supremo, que destacou, no entanto, que o INSS tem se esforçado para reduzir o tempo de espera na fila.

 

A fila é maior para quem depende de realização de perícia médica e avaliação social. E a situação tende a piorar com a greve dos médicos peritos e dos servidores administrativos do INSS, entre eles os assistentes sociais. Com a paralisação, perícias que estavam marcadas para abril estão sendo remarcadas para agosto. Segundo dados do governo, metade dos peritos cruzou os braços e 20% dos servidores do INSS aderiram ao movimento por reajuste salarial.

 

A situação, que estava complicada, tende a piorar, segundo integrantes do governo ouvidos pelo EXTRA sob anonimato. O volume represado de pedidos de aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e acidente de trabalho pulou de 254.023 em julho de 2019 para 964.560 em março deste ano, aumento de 280% no período.

 

Acordo no Supremo

 

Na tentativa de resolver o problema quase crônico da fila do INSS, Ministério Público Federal, Defensoria Pública e INSS firmaram um acordo, homologado pelo Supremo Tribunal Federal, em meados de 2021, que fixou prazos máximos para o reconhecimento do direito dos segurados. Os prazos variam entre 30 dias e 90, dependendo do tipo de benefício. No caso de descumprimento destes prazos, o INSS fica obrigado a pagar juros, além da correção monetária para os segurados, quando o benefício for liberado.

 

Contudo, o convênio ainda não está valendo para os casos que dependem de perícia médica e avaliação social. Pelos termos do acordo, esse tipo de atendimento somente voltaria a ter prazo limitado com a retirada das medidas de enfrentamento da Covid-19 e pelo retorno da atividade pericial.

 

Por causa desse acordo, a fila do INSS para benefícios simples, que não dependem de perícia, caiu de 1,76 milhão em janeiro para 1,69 milhão em março, mas beneficiou mais casos simples, sem a necessidade de perícia. Com isso, o prazo médio total para a concessão de todos os tipos de benefícios é de 94 dias, influenciado por pedidos simples de aposentadoria, BPC para idosos e salário-maternidade, por exemplo. Mas essa situação encobre a demora para os casos de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e BPC para pessoas com deficiência.

 

Segundo técnicos do próprio governo, o INSS está priorizando os benefícios incluídos no acordo e deixando de lado outros tipos de requerimentos, o que faz com que uma fila encolha e outras aumentem. Contudo, todo o rol de benefícios está sob a responsabilidade do INSS. Na realidade, o tamanho da fila é de 2,859 milhões.

 

A defensora pública federal Fernanda Hahn observou que o serviço médico federal responsável pela perícia está se valendo de cláusulas do acordo para não começar a contar o tempo dos requerimentos que dependem desse tipo de atendimento. O número de perícias diárias caiu nos últimos meses, sob o argumento de que é preciso higienizar as salas por causa da pandemia.

 

— A gente já tem um passivo de perícia e isso vai agravar com a greve dos peritos — disse.

 

A defensora afirmou que o comitê está discutindo alterações no acordo, antes mesmo de o governo decretar o fim da pandemia.

 

A procuradora regional da República e membro do comitê, Zélia Luiza Pierdoná, defendeu que o INSS adote alternativas para a greve dos peritos, como a realização de consultas via teleatendimento para benefícios por incapacidade. Ela enfatizou, por outro lado, que o cenário de pandemia já se arrefeceu e que é preciso ajustar o acordo.

 

— A gente não quer desfazer o acordo, mas queremos que se inicie a contagem do prazo em relação às perícias — disse a procuradora, acrescentando que o assunto será discutido no comitê no dia 27 de abril.

 

Outros setores impactados

 

Outro grupo que enfrenta dificuldades no INSS são os pescadores de baixa renda, que têm direito ao seguro defeso. A fila do seguro defeso subiu de 295.023 mil em julho de 2019 para 332.606 em março deste ano.

 

O tempo de espera também aumentou para quem depende do certificado do tempo de contribuição, o que tem prejudicado servidores públicos que buscam contar tempo no setor privado para fins de aposentadoria.

 

O mesmo acontece no lado inverso para os regimes próprios de previdência dos estados e municípios, que cobram uma compensação da União pelo tempo de recolhimento do funcionário ao INSS antes de ingressar no serviço público. Neste caso, o tempo de espera pode chegar a três anos.

 

Segundo dados oficiais, a atuação do INSS no combate a fraudes também está prejudicada: o volume de processos com suspeita de irregularidades subiu de 590 mil em dezembro de 2021 para 607 mil em março de 2022. A média mensal de processos de fraudes concluídos por mês caiu de 37 mil para 13 mil, no período.

 

Falta de pessoal

 

Um dos principais problemas para o aumento das filas do INSS, segundo o governo, é a falta de pessoal. O novo ministro do Trabalho e Previdência, José Carlos Oliveira prometeu adotar medidas para reduzir o tamanho da fila, como o pagamento de bônus, uma espécie de hora extra para servidores analisarem processos represados, além do fluxo normal de trabalho. Mas, quase três semanas após a sua posse, esta medida ainda não foi implementada.

 

Outra ação, seria realocar para a análise de requerimentos servidores que atuam no atendimento. Para isso, é preciso autorizar a contratação de temporários e terceirizados para não prejudicar quem procura as unidades do INSS. Mas essa ação ainda é apenas um plano do governo.

 

O INSS afirma ter investido na automatização de processos, mas o ritmo da Dataprev, estatal que cuida do processamento, está lento, segundo técnicos envolvidos nas discussões. Contudo, casos mais complexos exigem análise direta dos servidores.

 

A realização de concursos públicos ajudaria a resolver o problema de forma definitiva, mas o processo seletivo e treinamento demoraria mais que um ano, explicou um integrante do governo. A contratação de terceirizados seria a solução mais rápida e de menor custo.

 

Porém, o orçamento do INSS em 2022 para custeio de suas despesas é o menor em muitos anos, tendo em vista o veto pelo governo de quase R$ 1 bilhão de emendas feita pelo Congresso Nacional para o INSS. Os recursos disponíveis não são suficientes sequer para a manutenção das despesas básicas para o funcionamento do INSS, logo não possibilitam a contratação de terceirizados.

 

Vidas 'paradas' à espera de uma solução

 

O defensor público da União, André Ribeiro Porciúncula, chama a atenção para a necessidade de rever a suspensão de prazos para benefícios que necessitam de perícia médica e avalia que esse ponto do acordo homologado no Supremo no ano passado precisa ser revisto. O EXTRA teve acesso a dois casos de BPC para pessoas com deficiência que se arrastam há mais tempo que o limite de 90 dias. Um deles, negado, foi parar na Justiça.

 

A vida do pedreiro João Ramos de Vasconcelos, de 58 anos, morador do Morro do Dendê, da Ilha do Governador, na Zona Norte do Rio, há pouco mais de dois anos passou por uma reviravolta: ele foi diagnosticado com linfoma não Hodgkin, um tipo de câncer que tem origem nas células do sistema linfático e que se espalha de maneira não ordenada pelo corpo. Com isso o sistema imunológico fica enfraquecido e não consegue combater doenças.

 

Tratado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), João foi duplamente penalizado. Descobriu a doença em fevereiro de 2019, mas só conseguiu iniciar o tratamento em julho daquele ano. Por conta disso, ficou sem renda e, consequentemente, sem ter como pagar o INSS, o que fez com que perdesse a qualidade de segurado. Por conta disso, ele perdeu o direito ao auxílio-doença previdenciário, que foi indeferido pelo órgão por duas vezes. A advogada Camila Souza, contesta a decisão do INSS:

 

— O INSS alega que ele manteve a qualidade de segurado até junho e que a doença só foi diagnosticada em julho. O que não é verdade, pois em fevereiro ele já estava com exames na clínica da família com o laudo atestando a doença. Não justificaria negar o auxílio-doença — diz Camila.

 

Vivendo com a ajuda de familiares e amigos, já que não tem condições de trabalhar, João deu entrada no BPC para pessoa com deficiência em maio de 2021 e, passados 11 meses, ele sequer foi chamado para passar por perícia médica e avaliação social, essenciais para a concessão do benefício.

 

Procurado, o INSS informou que o sistema não concedeu o BPC porque João havia tentado o auxílio-doença.

 

"Quando o requerimento for novamente processado automaticamente, caso não haja mais nenhuma pendência, o requerente poderá proceder com o agendamento da Avaliação Social e da Perícia Médica", informou o INSS em nota.

 

— Dependo das pessoas para tudo, da alimentação aos remédios que preciso tomar para enfrentar essa doença — lamenta João, que teme o agravamento do seu estado de saúde.

 

Ação na Justiça

 

Outro caso é o de Juliana Nascimento, de 37 anos, moradora de Belford Roxo, na Baixada Fluminense. Mãe de Giovanna, de 7, diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista, Juliana está desempregada desde fevereiro de 2020. Ao tomar conhecimento de que a filha teria direito ao Benefício de Prestação Continuada (BPC/Loas), Juliana juntou a documentação necessária e deu entrada no requerimento em outubro de 2020. Cumpriu exigências documentais solicitadas pelo INSS, a menina fez as avaliações médica e social, mas somente em dezembro de 2021 veio a resposta: pedido negado.

 

— Apresentei os laudos que comprovam o autismo, receitas, exames, levei minha filha para passar por avaliações social e médica, mas mesmo assim o benefício foi indeferido — lamenta Juliana.

 

Em um dos laudos a que o EXTRA teve acesso, a médica que atende Giovanna no CER de Duque de Caxias, também na Baixada, afirma que “a paciente tem diagnóstico de Transtorno de Espectro Autista” e informa a Classificação Internacional de Doenças (CID) F84-0.

 

Em outro laudo, a médica afirma que "a paciente é acompanhada na neuropediatria com diagnóstico de Transtorno de Espectro Autista, preenchendo critérios conforme o DSM-V (Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais, na sigla em inglês). Trata-se de uma condição mental permanente".

 

Ao final do documento, a médica acrescenta que a pequena Giovanna necessita de suporte constante dos responsáveis, no caso de Juliana, e que a criança é dependente para atividades da vida diária. No entanto, o INSS negou o benefício.

 

Procurado, o INSS informou que "o benefício solicitado pela segurada Giovanna foi indeferido por não atender ao critério de deficiência para acesso ao BPC/Loas".

 

Juliana não teve outra alternativa e buscou a Justiça para ter o direito reconhecido. A ação está em andamento

 

FONTE:EXTRA ONLINE

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