Em meio à pandemia da covid-19, o auxílio emergencial
contribuiu para a queda temporária da pobreza no Brasil. Segundo o estudo
Covid, Classes Econômicas e o Caminho do Meio: Crônica da Crise até Agosto de
2020, divulgado pelo Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas
(FGV Social), 15 milhões de brasileiros saíram da linha da pobreza até agosto
de 2020, uma queda de 23,7%. A comparação é feita com os dados fechados de
2019. De acordo com a definição usada pela FGV, a pobreza é caracterizada pela
renda domiciliar per capita de até meio salário mínimo (R$ 522,50).
Segundo o coordenador da pesquisa, Marcelo Neri, apesar de o
país ainda registrar 50 milhões de pobres após esta queda, este é o nível mais
baixo de toda a série estatística. “De maneira geral, a gente observou um boom
social inédito, mesmo comparando com períodos pós-estabilização, que foram
períodos de boom social. Em toda a série estatística a pobreza nunca esteve num
nível tão baixo, são 50 milhões de brasileiros. A queda foi realmente inédita,
de acordo com as séries estatísticas”.
A redução de pobreza chegou a 30,4% na Região Nordeste e a
27,5% no Norte do país. No Sul, a redução foi de 13,9%; no Sudeste de 14,2% e
no Centro-Oeste a queda na pobreza chegou a 21,7%.
Segundo a FGV Social, essas regiões têm maiores parcelas do
público-alvo do Auxílio Emergencial. “O Brasil, nos nove meses do auxílio
emergencial, até o final do ano, pretende gastar R$ 322 bilhões, cerca de nove
meses são nove anos de Bolsa Família, uma injeção de recursos bastante
substantivo”, destaca o pesquisador.
Mercado de trabalho –
Por outro lado, Neri disse que as camadas com renda acima de dois
salários mínimos per capita perderam 4,8 milhões de pessoas na pandemia e os
dados do mercado de trabalho demonstram forte retração. “Houve uma queda de
renda de 20%. O índice de Gini teve um aumento muito forte, que é o índice de
desigualdade. A renda do trabalho da metade mais pobre caiu 28%. Então guarda
um certo paradoxo na pesquisa. As rendas de todas as fontes tiveram um aumento
espetacular, principalmente na base da distribuição, enquanto a renda do
trabalho, que deveria ser a principal renda das pessoas, teve uma queda
igualmente espetacular, especialmente também na base da distribuição. O que
explica esse paradoxo é a atuação do auxílio emergencial, que atingiu no seu
pico com 67 milhões de brasileiros”.
Com a queda no topo e a subida na base das classes de renda,
as camadas intermediárias tiveram um aumento de 21,4 milhões de pessoas, o que
equivale à quase metade da população da Argentina. Neri lembra que a diminuição
na pobreza é temporária e tende a ser totalmente revertida após o fim do
auxílio emergencial. “O boom social ocorrido em plena pandemia é surpreendente,
mas enseja uma preocupação, porque a sua principal causa, que é o auxílio
emergencial, generoso, que foi concedido, ele cai à metade agora em outubro, e
depois é totalmente extinto em 31 dezembro. Então, a nossa estimativa é que
esses 15 milhões que saíram da pobreza vão voltar à velha pobreza de maneira
relativamente rápida. Isso equivale a cerca de meia Venezuela em termos
populacionais”, disse o pesquisador.
A pesquisa aponta também que ainda não foram definidos novos
programas sociais para contornar a crise atual, bem como há “cicatrizes
trabalhistas de natureza mais permanente abertas pela crise”.
Além disso, a questão sanitária preocupa, já que o segmento
mais pobre, público alvo do auxílio emergencial, tem taxas mais baixas de
isolamento social, o que indica o impedimento das pessoas mais pobres em
conseguirem exercer “ações mais ajustadas às necessidades impostas pela
pandemia”.
(Com a Agência Brasil)
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